O túmulo vazio

No túmulo vazio, onde o corpo fora depositado, via-se somente a mortalha que envolvera o Cristo – um lençol de linho, em cujas dobras e manchas olhos espantados se fixavam. Poderia haver, nas suas exortações sobre a ressurreição, um sentido mais concreto do que abstrato? Pedro, diante do sepulcro, garimpava no chão de sua consciência respostas às perguntas que a sua mente nem mesmo podia formular — a vista corria por sobre as pedras e divisava distâncias; aos ouvidos, as palavras de Maria Madalena ainda ressoavam: “Tiraram o Senhor Jesus do túmulo, e não sabemos onde o puseram”. No fundo do seu coração, ruminavam as dores da antevéspera: o remorso por tê-lo negado três vezes espezinhava-o sobremaneira. 

O canto do galo, tecido em tom rouco e indecoroso, asfixiou no peito do apóstolo até mesmo o ímpeto de choro, que expressou-se apenas em seu íntimo, revelando-se ao avesso, onde homem nenhum, a não ser ele, podia chegar. Por negar a Cristo três vezes, o remorso de Pedro foi insuportável, dilacerando-lhe a alma: não coube nele, perpassou-o, excedeu-o — superando a agonia de sua própria crucificação, anos depois, a dor da negação foi excruciante. 

Dentro de mim, um túmulo: meu cadáver jaz, frio e inerme — o mundo matou-me as ilusões da alma; já não me animam as formas e expressões que se assomam à vista. Meu Deus! Novamente nesta busca por significado me afogo, sôfrego desespero, e deblatero-me; busco ar nas lufadas de vento que balouçam na superfície. A lua, alçada à abóboda, assiste ao meu suplício, ilumina-o na noite escura. Não tem jeito. É inevitável a morte no caminho de quem consigo se encontra. Quem me dera ter diante de mim a figura de um apóstolo — João, com seus olhos profundos, como árvore enraizados, olhando-me a carcaça. Talvez pudesse eu renascer também, a exemplo do Cristo.

Em todos nós cinge essa necessidade de retorno à consciência original — como caídos estivéssemos na inexorável roda da vida cotidiana, que em nós oprime o divino e exalta o mundano. Urge, desde a penumbra de nossas entranhas, um valor que, no âmago de cada um, resplandeça e nos ilumine: Deus, portanto, é necessário.

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